quarta-feira, 29 de junho de 2011

Querida,
entenda que não posso mais te esperar. As minhas condições físicas estão tão limitadas quanto a possibilidade de ficar para sempre com essa falta de meio-termo. Te esperei no portão todas as noites do outono. Até naquelas mais frias, quando eu chegava da faculdade e tocava baixinho algumas palavras com a lua, ficava atenta se a sua sombra surgiria de algum lugar. Você não sorriu para mim, nem mesmo enquanto eu pisava em folhas secas indo para o trabalho. Você não passou as madrugadas insones ao pé da cama, nem mesmo me instigou a gritar, espernear ou ir contra tudo. Aceitei. Você não estava aqui. Agora o inverno chegou e a calçada é mais suja e o vento não deixa apenas o meu rosto dormente, as minhas mãos e os meus pés passam a não existir depois de um tempo expostos na madrugada. Achei que você soubesse como a sua presença aqui, nesta casa barulhenta, fosse me dar paz, pelo menos um pouco dessa paz sem cor e sem textura que eu falo de vez em quando. Escrevi de mais, sem o seu auxílio, e o desgaste psicológico também não te trouxe. Você não veio, o máximo que chegou perto de mim foi ao final da rua azul que tem aqueles postes de luz que mal iluminam. E estou esgotada de palavras. Não posso e não sei escrever com o vazio como as minhas personagens. Você entende esta diferença? Te vejo como um ser real e não como um fantasma, um fantasma que deteriora as pessoas, como a maioria pensa sobre você. Eu até que te amei nessa espera. Até queria te manter aquecida neste inverno se, de súbito, você batesse de leve na porta do meu quarto, deixasse as botas de chuva do lado de fora. Cansei de te esperar. E só fico triste com essa distância. Você bem sabe que a minha inspiração vinha quando você estava ao meu lado. Não posso e não sei mais digitar frases bonitas e coerentes. Não quero e não devo criar personagens. Você me dava a certeza de que eles não sairiam das linhas e fizessem parte da minha vida. Não tenho certeza nenhuma, agora. Prefiro mencionar e dissertar sobre a realidade que, apesar de me embalar nas noites difíceis, continua se enfiltrando nos sonhos. Você era uma guardiã fiel. Fico tentando entender por que é que, de repente, a minha presença deixou de significar. Penso se foram os meus princípios ou a minha deslealdade com as pessoas. Engraçado que sempre te vi como um ser inclinado a fazer o mau, mas, ao mesmo tempo, comprometido com quem você gosta. Talvez você não me ame mais. Tudo bem. Só estou te escrevendo para dizer que não se aproxime mais de mim no próximo mês nem até o final do verão. Não vou abrir a porta para você. Adeus, loucura. Vou suprir essa falta. Espero que você não tenha rivais ou resolva se vingar tomando o meu inconsciente. O erro foi seu.

p.s: desculpe o meu vocabulário pobre. A sua presença é que me dá o repertório adequado.

Com um certo carnho que vai se perdendo no ar gelado, MB.

Por: Thaís Zimmer Martins

segunda-feira, 27 de junho de 2011

"Trago lágrimas, sorrisos, histórias, abraços. Trago momentos felizes, momentos de decepção.
Carrego pessoas, amores e desamores, amigos e inimigos,
desafetos, paixões. Não sou um livro aberto, mas também não tão fechado 
que você não consiga abrir, basta ter jeito, saber tocar as páginas, uma a uma, e descobrirá de que
é feito cada uma delas."

Caio Fernando Abreu
"Se eu não consigo melhorar a qualidade do ser humano
que sou, me libertar das mesmices e do jeito padrão de
reagir as emoções, eu fico igual. Eu quero ser e fazer
diferente. Eu quero ser um ponto de luz, é pra isso que eu
estou neste planeta."

Denise Portes
"Quem és tu que me lês? És o meu segredo ou eu o teu?"

Clarice Lispector
A gente pode até se vingar de toda a chatice, a grossura, a crueldade e
angústia, sendo feliz.

Lya'Luft

terça-feira, 21 de junho de 2011

Distraída

- Desculpa, estava fitando o horizonte. É que olhar pra frente me faz olhar pra dentro. E eu gosto das cores dos meus gostos, dos sabores das minhas escolhas e das carícias dos meus desejos. Aqui dentro faz um calor gostoso, mesmo sem companhia. Parece manta nos pés em varanda gelada. Manta nos pés e poesia na cabeça.

Pequenos-Despropósitos

...Coração não é tão simples quanto pensa
Nele cabe o que não cabe na dispensa...


Ana Jácomo

A qualquer distância, em qualquer instante, é possível abrirmos os
olhos para dentro, sintonizar o coração e enviar um sorriso de
amo.



O Sorriso das 5horas posteriores.
Sem rancor, sem saudade, sem tristeza. Sem nenhum
sentimento especial a não ser a certeza de que, afinal, o 
tempo passou.

Caio Fernando Abreu

Sim... O tempo passou e parece-me que só pude notar agora. Já não vejo mais as cartas,
as nossas músicas.  O nosso 'olá' tornou-se estranho e vazio. Desculpe-me. Mais o tempo realmente passou.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Porque meu pensamento é assim
perfume ao vento
pólen que fecunda outro jardim

é água
trigo
areia que muda de lugar

as folhas da árvore formam um tapete
os frutos maduros alimentam

Porque meu pensamento é assim
verso sem leito
carta sem espera
é lágrima que vem do sorriso
é riso seguido do chorro

silêncio
palavra
sentido
nada.


  • A Poeta de Alcova

terça-feira, 14 de junho de 2011

'Saudade'

Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida.
Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,
quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,
eu sinto saudades...

Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,
de pessoas com quem não mais falei ou cruzei...

Sinto saudades da minha infância,
do meu primeiro amor, do meu segundo, do terceiro,
do penúltimo e daqueles que ainda vou ter, se Deus quiser...

Sinto saudades do presente,
que não aproveitei de todo,
lembrando do passado
e apostando no futuro...

Sinto saudades do futuro,
que se idealizado, provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...

Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei!
De quem disse que viria
e nem apareceu;
de quem apareceu correndo,
sem me conhecer direito,
de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.

Sinto saudades dos que se foram e de quem não me despedi direito!
Daqueles que não tiveram
como me dizer adeus;
de gente que passou na calçada contrária da minha vida
e que só enxerguei de vislumbre!

Sinto saudades de coisas que tive
e de outras que não tive
mas quis muito ter!

Sinto saudades de coisas
que nem sei se existiram.

Sinto saudades de coisas sérias,
de coisas hilariantes,
de casos, de experiências...

Sinto saudades do cachorrinho que eu tive um dia
e que me amava fielmente, como só os cães são capazes de fazer!

Sinto saudades dos livros que li e que me fizeram viajar!

Sinto saudades dos discos que ouvi e que me fizeram sonhar,

Sinto saudades das coisas que vivi
e das que deixei passar,
sem curtir na totalidade.

Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que...
não sei onde...
para resgatar alguma coisa que nem sei o que é e nem onde perdi...

Vejo o mundo girando e penso que poderia estar sentindo saudades
em Japonês, em Russo
em Italiano, em Inglês...
mas que minha saudade,
por eu ter nascido no Brasil,
só fala português, embora, lá no fundo, possa ser poliglota.

Aliás, dizem que costuma-se usar sempre a língua pátria,
espontaneamente quando
estamos desesperados...
para contar dinheiro... fazer amor...
declarar sentimentos fortes...
seja lá em que lugar do mundo estejamos.

Eu acredito que um simples
"Lmiss you"
ou seja lá
como possamos traduzir saudade em outra língua,
nunca terá a mesma força e significado da nossa palavrinha.

talvez não exprima corretamente
a imensa falta
que sentimos de coisas
ou pessoas queridas.

E é por isso que eu tenho mais saudades...
Porque encontrei uma palavra
para usar todas as vezes
em que sinto este aperto no peito,
meio nostálgico, meio gostoso,
mas que funciona melhor
do que um sinal vital
quando se quer falar de vida
e de sentimentos.

Ela é a prova inequívoca
de que somos sensíveis!
De que amamos muito
o que tivemos
e lamentamos as coisas boas
que perdemos ao longo da nossa existência...

Clarice Lispector

quinta-feira, 9 de junho de 2011

"Quero as janelas abrir para que o sol possa vir iluminar nosso amor..."

(Título: Janelas abertas, Tom Jobim e Vinícius de Moraes")


O amor seria somente mais uma palavra. Uma palavra como outra qualquer: cadeira, livros, horizonte ou paralelepípedo. Uma palavra perdida em um dicionário. Uma palavra imprecisa em uma canção. Uma palavra escrita numa placa no deserto. O amor poderia ser o deserto ou a canção, porque às vezes, nos dá uma espécie de sede, em outras, um carinho ao pé do ouvido.

Quem sabe o amor passasse despercebi, em silêncio, tão em calmaria que nem distraísse minha atenção das outras coisas bobas do mundo. Quem sabe o amor chegaria, como chegam correspondências de promoções, que a gente amassa e joga fora. Quem sabe o amor viesse como uma rosa entre as outras rosas em buquê, e olhando de cima, é tudo tão igual. Quem sabe fosse uma rua desconhecida, um creme para as mãos, um jeito de sorrir ou olhar, uma mania, um prato árabe, uma pizza, um peixe que vive só no Mar Egeu, uma marca de xampu ou relógio, um sabor de suco, uma fruta. Embora para tudo, seja todo o sentido.

Poderia sim ser quase nada, se não tivesse sido tudo. Poderia não ter significância ou significado, senão fosse você. Senão fosse seu riso me chamando para dançar no meio do mundo, senão fosse seu nome se espalhar por todos os cantos dos meus pensamentos e os poros da minha pele, senão fosse o seu olhar na primeira vez que te vi, senão fosse seu ar de segurança, senão fosse sua simplicidade em falar. Se por um momento só, você não tivesse sido tão profundo. Se por um momento só, não tivesse sido você, teria sido tudo inútil, teria sido tão em vão.

O amor vem depois de você, e as palavras vem depois do amor. Tão clichê, tão bobo, quando a gente quer dizer que está apaixonada e sente tão amada a ponto de esquecer o resto do mundo. Tão tola nossa forma mais planejada para não ser amarrada pela paixão. Não vale nada toda razão quando o coração desperta.

O amor seria sim como qualquer palavra... Se não fosse sua chegada.

Cáh Morandi

segunda-feira, 6 de junho de 2011

"Por que metade de mim é a lembrança do que fui, mas a outra metade eu não sei..."

(Título: Metade, Oswaldo Montenegro)


É mais ou menos isso que a gente fica quando alguém vai embora:
metade. Metade de qualquer coisa que não tem nome, nem história
ou comprovação científica, mas a gente sabe que existe, afinal
perder é a forma mais próxima da real sensação do sentir. Sentir o
cheiro que some aos pouquinhos dos lençóis, o ar descer mais
pesado e empurrando essa tal de vida para dentro e depois para
fora, sentir o mesmo vazio que o lado esquerdo do armário agora
possui. Nunca estamos preparados para a hora do adeus, do até
logo ou mesmo das despedidas que dispensam a ironia boba das
palavras. Meta e às vezes nem isso. Com o tempo a vida nos
ensina a acumular lembranças como quem coleciona discos ou selos
postais, nos desencanta dessa bobagem de queremos ser
sentimentais ou amorosos, mas não é tarefa fácil descartar as
memórias e algumas pessoas também não querem aprender a serem
menos humanas. Como se o fato de esparramar o passado no chão e
escolher o que guardar ou não, nos deixasse mais limpos ou leves.
Não. Talvez nos sentirmos sujos e pesados nos faça um pouco mais
dignos, talvez não, e quem sabe não nos importa também, quem
sabe não tenhamos vontade de descartar nada. A possibilidade de
encontrar no meio desse lixo que fica, qualquer misera partícular de
beleza e alumbramento, nos dá uma espécie de crença em nós
mesmos. Uma crença em nossos adeuses próprios. Uma crença de que
no meio do lodo e da poeira, teríamos guardado qualquer coisa de
bonito para ser encontrado. É preciso passar pelo tempo de se ficar
só, é preciso estar no mais fundo do poço, é preciso ter mergulhado
de cabeça no meio da nossa própria lama. Metade de uma escada que
nos tire do poço. Metade de um mapa que nos levasse ao tesouro.
Metade é a necessidade de nos sentirmos inteiro. Metade é se
conformar em ainda ter a companhia de qualquer coisa que foi embora.

(Cáh Morandi)

sexta-feira, 3 de junho de 2011

"Qual é o nome que eu nunca chamei?"

(Você existe, eu sei - Biquíni Cavadão)

Podemos esperar, esperar pelas coisas boas, pela esperança, pelos planos que temos. Podemos esperar porque nada mais nos é possível além disso, apenas preparar o terreno, persistir no foco, acreditar incansavelmente na possibilidade de que os sonhos serão sem breve, ou não, realidade.

Espero pelo vôo, espero sentada na sala de embarque, monótona e silenciosa. Muitas pessoas, destinos diferentes, vidas em contraste, em direções inemagináveis. Em breve embarcaremos no avião, como em breve embarcarei para aquilo que todo dia espero ser a hora.

Espero por você, espero tão confiante, tão certa de que você, em algum lugar está procurando um caminho para me encontrar também. Espero por você quando abro as cortinas da janela de manhã e imagino que você está prestes a virar a esquina, e de repente acontecer alguma coisa diferente em nossas vidas. Espero por você se chove e os trovões agora caem do teto do meu quarto. Espero por você se preciso de uma carona para Búzios ou Belém. Espero por você quando passo a chave na porta e fico observando os carros, que não param. Espero por você se Maria Bethânia canta repentinamente no rádio, na letra que diz "quero ficar com você, e é tão fundo que posso dizer que o fim do mundo não cai chegar mais...". Espero por você quando vejo os casais planejando o futuro, e veêm os filhos chegando, e imagino que se pelo menos eu te conhecesse. Espero por você na hora do sufoco, na hora do cansaço, na hora que os pés precisam das mãos, na hora que o corpo precisa de um abraço, na hora que os cabelos precisam de um carinho, na hora que o pescoço precisa de um beijo, na hora em que a boca sente sede, na hora que uma voz me chama e o chamado não é teu. Preciso de você e deixo o coração à deriva. Preciso de você e faço da vida uma sequência de vazios. Preciso de você e não sei aonde te encontrar. Preciso de você e me preparo todos os dias para te esperar. Preciso de você e arranjo formas de sobreviver dia após dia até tua chegada.

Espero, duramente espero, para descobrir teu nome, as cores da tua roupa, o lugar que você mora, o sonho que segue, o momento que mais gosta de lembrar. Espero e reservo restaurantes. Espero e programo viagens e roteiros. Espero e faço compras para o fim de semana. Não há mais nada além da espera e que apesar da demora, sei que você virá.

Você virá num dia de céu claríssimo e tão azul, tão branco, num domingo de primavera repentina. Você virá e antes poderei ouvir teu riso, até tua face se desfazer da distância. Você virá e eu esquecerei de todas as palavras que decorei para essa hora. Você virá e eu sofrerei um terremoto. Você virá e eu não quero nenhuma outra promessa, eu só quero tua presença, acordar e ver o lençol desarrumado do outro lado da cama. Você virá e eu que não sei nada de você estarei prestes a me arrepiar com a tua primeira palavra. Você virá com o teu nome enquanto pesquiso todos os sobrenomes para saber se o teu rimará com o meu no final.

Espero e é para isso que tenho dedicado parte da vida. Espero, até aqui é tudo que tenho parar contar.

Te espero sempre, sempre, sempre.

Você virá. Sei que virá por uma dessas avenidas com nomes de poetas, distraídos um em direção ao outro, como todo encontro, como todo amor acontece.

Se perca. Me perco para nos encontrarmos.

Por: Cáh Morandi